A espectroscopia e a cor das estrelas e dos átomos

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I. O que estuda a espectroscopia?

Desde muito tempo atrás, na construção de fogos de artifícios, sabe-se que para se produzir luz verde, usam-se sais de bário, para se produzir luz vermelha, sais de estrôncio, e para se produzir luz amarela, usam-se sais de sódio. Assim, cada sal possui uma cor que lhe é característica.


Sabe-se também que estrelas possuem diferentes brilhos e cores: o brilho de algumas é mais intenso que de outras, umas são azuis, outras vermelhas. Isso nos permite identificar as mais diferentes estrelas através de sua cor e brilho.

São muitas as coisas, portanto, que podem ser identificadas a partir de sua luz e cor. A espectroscopia, analisando a luz emitida através de instrumentos chamados espectroscópios, é a parte da Física que identifica as mais diferentes coisas a partir dessa análise.

II. As cores das estrelas

A origem da espectroscopia pode ser atribuída à Newton quando, em 1666, fez a luz do Sol passar por um prisma, como mostram as imagens abaixo.


 


Com essa experiência, Newton descobriu que a luz branca do Sol é formada por todas as cores. Ele, a partir de uma analogia com as sete notas musicais, dividiu o espectro da luz do Sol em sete cores: vermelho, laranja, amarelo, verde, azul, anil e violeta. Além disso, Newton fez passar as luzes coloridas por outro prisma e viu a luz branca surgir do outro lado.

Em 1814, o jovem alemão Joseph Fraunhofer, que trabalhava com lentes de vidro para a construção de instrumentos óticos, inventou o espectroscópio. O espectroscópio era um aparelho que possuía um prisma e um tubo com lentes e uma grade de difração, que foi usado por ele para observar a luz do Sol.


Fraunhofer observou que, além das cores observadas por Newton, o espectro do Sol possuía 574 linhas escuras, como mostra a imagem abaixo.


Em 1869, o astrônomo italiano Angelo Secchi acoplou em seu telescópio um espectroscópio e observou o espectro de diferentes estrelas. Observou que as estrelas possuíam cores mais intensas, outras menos, e uma sequência e um número diferentes de linhas pretas.

As Três Marias são o cinturão da constelação de Órion, enquanto Betelgeuse é a estrela à esquerda vermelha e Rigel é a estrela azulada à direita.

Se observadas por um espectroscópio, as estrelas mais brilhantes da constelação de Órion, Betelgeuse e Rigel, apresentam os seguintes espectros.

Espectro de Betelgeuse.
  
Espectro de Rigel.

É fácil observar que o espectro da estrela vermelha Betelgeuse possui a cor vermelha mais intensa do que as outras, enquanto o espectro da estrela branca Rigel possui todas as cores, com destaque para o azul. Além disso, o espectro de Betelgeuse possui mais linhas do que o que Rigel.

Hoje sabemos que a cor das estrelas está associada à sua idade e temperatura: as azulada (as mais quentes) são estrelas mais jovens, as mais avermelhadas (as mais “frias”), são estrelas mais velhas. O número de linhas no espectro das estrelas, por sua vez, está associado aos elementos químicos presentes nas estrelas. Em 1910, surgiu a classificação de Harvard para as estrelas, dividindo as estrelas em 7 tipos, como mostra a tabela abaixo.
  

A tabela acima mostra que o Sol é uma estrela amarela tipo G, cuja temperatura superficial é de cerca de 6.000˚C, mas em seu núcleo a temperatura é mais de 10.000.000 ˚C. É uma estrela de tamanho médio, que brilha há cerca de 5 bilhões de anos e brilhará mais esse tanto, quando se tornará uma estrela gigante vermelha, aumentando seu tamanho em centenas de vezes e engolindo a Terra, e, depois, uma estrela anã branca, quando terá perdido grande parte de sua massa e terá o tamanho da Terra. Na medida em que isso acontecer, sua cor e temperatura se alterarão.


Hoje também sabemos que o principal elemento químico no Sol é o Hidrogênio e depois o Hélio, como mostra a imagem abaixo.



O Sol e todas as outras estrelas produzem energia a partir da fusão nuclear, quando núcleos de átomos de Hidrogênio se fundem e formam o núcleo do átomo de Hélio. Os outros elementos químicos da tabela periódica também são formados a partir de fusões nucleares em estrelas. Assim, três átomos de hélio podem se fundir e formar um átomo de carbono, ou um átomo de carbono se fundir com um átomo de hélio e formar um átomo de oxigênio. Isso acontece até a formação do ferro, sendo que os elementos químicos mais pesados se formam a partir da explosão de estrelas.

Isso mostra que são as estrelas, como o Sol, as responsáveis pela produção dos elementos químicos. O tamanho da estrela e, consequentemente, a quantidade de fusões nucleares que ocorrer em seu interior, é o que determinará quais elementos existem nas estrelas.

  
A tabela acima mostra que o Hidrogênio e o Hélio tenham sido formado durante o Big Bang enquanto os outros elementos químicos foram formados na fusão nuclear em estrelas. As estrelas pequenas (“small stars”) formam elementos químicos até o Neônio (Ne), enquanto estrelas maiores (“large stars”) formam elementos químicos mais pesados, como o Ferro. Elementos químicos mais pesados ainda, como o Urânio (U), são formados a partir da explosão de estrelas, conhecidas como Supernovas (“Supernovae”).

Assim, dependendo do tamanho da estrelas e de sua idade, ela possui mais ou menos elementos químicos, como mostra a imagem abaixo. Repare que quanto mais nova a estrela, mais branca (estrela tipo O) e azul (estrela tipo B) ela é menos linhas e elementos químicos possui. Por outro lado, estrela tipo M são mais velhas, mais vermelhas e com mais linhas, pois possuem mais elementos químicos.

  
III. As cores dos átomos

Ao mesmo tempo que o espectroscópio estava sendo usado para analisar o brilho das estrelas, os físicos Robert Bunsen e Gustav Kirchhoff utilizaram esse instrumento para observar as cores de diferentes átomos depois de aquecê-los.

Para isso, em 1859,  Bunsen aperfeiçoou o queimador de gás (depois chamado bico de Bunsen) e ele e Kirchhoff aperfeiçoam o espectroscópio.

  À esquerda, foto do bico de Bunsen e à direita as diferentes chamas por ele produzidas. A cor da chama indica sua temperatura, do amarela-laranja à 300˚C ao azul à 1600˚C.

  O espectroscópio de Kirhhoff e Bunsen.

Hoje em dia, os espectroscópios são muito semelhantes aos de Bunsen e Kirhhoff, como o da foto abaixo. Nele, ao invés de um prisma, existe uma grade de difração, mas seu efeito sobre a luz do átomo analisada é o mesmo.


 Aquecendo diferentes elementos químicos num bico de Bunsen e observando a luz produzida através de um espectroscópio, Kirchhoff e Bunsen enunciaram uma importante lei empírica: todo elemento químico é caracterizado por um espectro que lhe é próprio. No vídeo abaixo você pode ver o que hoje em dia se chama teste da chama: o fato de cada elemento químico possui uma cor e um espectros que lhes são próprios.


Assim, por exemplo, o Lítio possui uma cor vermelha, o Sódio é amarelo e o cobre é verde. Se essas luzes são observadas por um espectroscópio, vê-se o que linhas coloridas abaixo.

A linha mais forte do espectro do Lítio é de cor vermelha, o que fas a chama ter essa cor.

O Sódio é um elementos cuja linha com maior intensidade é o amarelo. Seu espectro possui mais linhas do que o Lítio, pois o átomo de Sódio é maior, possui mais eléctrons e maior também é a quantidade de transições entre as camadas que podem ocorrer, como veremos depois.

As linhas mais intensas no Cobre são as quatro verdes e a amarela e laranja. Combinando essas cores, vê-se o verde da foto à esquerda.

Assim, todos os elementos químicos têm uma cor e um espectro característico, como os das imagens abaixo.


Com a constatação de que cada elemento químico possui um espectro, Bunsen e Kirchhoff, um ano depois, em 1860, descobrem dois novos elementos químicos: o Césio (“de caesius, que entre os antigos servia para designar o azul da parte superior do firmamento”) e o Rubídio (“de rubidus, que entre os antigos servia para designar o vermelho mais intenso).

IV. Os átomos nas estrelas

Se o espectroscópio permitiu observar tanto as linhas pretas das estrelas como as linhas coloridas dos átomos depois de aquecidos, a conclusão que Kirchhoff era uma só: as linhas pretas no espectro das estrelas eram causadas pelos elementos químicos presentes nelas.

Sobre isso, Bunsen escreve que “Kirchhoff fez uma das mais belas e inesperadas descobertas: descobriu a causa das linhas escuras no espectro solar. Abre-se a possibilidade de se determinar a composição material do Sol e da estrelas fixas.”. Assim, conhecendo os espectros dos mais diferentes elementos químicos e comparando com os espectros das estrelas, podemos identificar quais elementos químicos existem nas estrelas. Bunsen e Kirchhoff descobriram no Sol o Cálcio, o Cromo, Níquel, o Bário, o Cobre e o Zinco. A imagem abaixo mostra o espectro de diferentes elementos e o espectro de um estrela.


Além de permitir identificar elementos químicos no Sol e nas estrelas, isso permitiu cientistas descobrirem elementos químicos até então não conhecidos na Terra. Em 1868, Pierre e Janssen e Norman Lockyer, analisaram, durante um eclipse solar, as linhas do espectro do Sol da Cromosfera (a penúltima camada do Sol) e encontraram linhas até então desconhecidas. Alguns anos depois, o elementos químico responsável por essas linhas foi chamado de Hélio (de Helios, palavra grega que significa Sol) e, apenas em 1895, conseguiu ser isolado a partir de um mineral radioativo, a cleveíta.

O Hélio foi descoberto a partir da análise do espectro da cromosfera. As linhas observadas por Fraunhofer, em 1814, são, principalmente, da fotosfera e da coroa solar.

V. As linhas nos espectros das estrelas e dos átomos

Foi o modelo atômico de Bohr, em 1913, que conseguiu explicar as linhas nos espectros das estrelas e dos átomos. Nesse modelo, Bohr postulou que: 1. os elétrons ao redor do núcleo só poderão movimentar-se em certas órbitas, onde não emitiriam radiação; 2. os elétrons podem mudar de órbita emitindo ou absorvendo radiação.

A idéia de átomo surgiu na Grécia Antiga com Leucipo e Demócrito. Cerca de 2.500 anos depois deles, em 1913, Bohr elabora seu modelo.

Vamos considerar o átomo de Hidrogênio, o mais simples da natureza (com um próton (+) no núcleo e um elétron (-) ao seu redor).

O elétron ao redor do núcleo pode ocupar diferentes camadas. Quando ele ocupa a primeira camada (K, ou n=1), dizemos que o átomo de Hidrogênio está em seu estado fundamental, o estado de menor energia.

Quando o elétron do átomo de Hidrogênio está no estado fundamental, ocupa a primeira camada ao redor do núcleo.


Porém, quando o átomo de Hidrogênio é aquecido (por exemplo com o bico de Bunsen, numa lâmpada de Hidrogênio ou numa estrela), o elétron pode mudar de camada, passando para uma camada de menor para uma camada de maior energia (de n=1 para n=2, de n=1 para n=3, etc.). Nessa situação, dizemos que o átomo está excitado.

Exemplos de átomos de Hidrogênio excitados.

Porém, o átomo excitado logo volta ao estado fundamental, ou seja, o elétron passa de uma camada de maior energia para uma camada de menor energia, sofrendo um salto quântico. Quando isso acontece, o elétron emite energia na forma de radiação eletromagnética.

O átomo de Hidrogênio emite radiação quando o elétron passa de uma camada de maior para uma camada de menor energia.

Dependendo do salto quântico, a radiação eletromagnética pode estar na cor vermelha, azul ou violeta, na faixa dos raios ultravioleta, etc. Assim, as linhas no espectro do átomo de Hidrogênio são as diferentes radiações eletromagnéticas emitida das mudanças de camadas dos elétrons nos átomos de Hidrogênio depois de aquecidos. Costuma-se dividir o espectro de Hidrogênio em séries, como as séries de Balmer e Lyman da imagem abaixo.

 
As linhas da série de Balmer são causadas quando o elétron passa das camadas 3, 4, 5, etc. para a camada 2, enquanto as linhas da série de Lyman são causadas quando o elétron passa das camadas 2, 3, 4, etc. para a camada 1.

Uma lâmpada de Hidrogênio, como a da imagem abaixo, possui um espectro na região visível que se destacam quatro linhas, vermelha, azul, anil e violeta, que, combinadas, formam a luz roxa da lâmpada.


Uma última coisa importante de se destacar é o fato de a linhas observadas no Sol e nas estrelas serem pretas, enquanto a dos elementos químicos são coloridas. Isso acontece porque no Sol os elétrons nos átomos absorvem energia, enquanto as linhas coloridas dos elementos químicos são linhas de emissão, como mostram as imagens abaixo.


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